quarta-feira, 31 de agosto de 2011

O destino do cofre

- Em nome do Conselho Maior agradeço a presença de todos – disse Camilo. É para nós motivo de satisfação constatar o número expressivo de narradores e de pessoas da comunidade que aqui estão para participar e prestigiar a discussão desta noite.

O que aumenta nossa responsabilidade e nos leva a refletir sobre a importância da decisão que nos espera. Como todos sabem, estamos aqui reunidos para decidir sobre a abertura do cofre. Por isto preparei algumas poucas palavras e prometo não me estender muito.

Para iniciar, senhores, lanço a pergunta: o que é um cofre? Um cofre é um compartimento onde se armazenam coisas de valor e documentos. Em geral, o colocamos atrás de um quadro, um espelho ou dentro de um armário. Nosso cofre, no entanto, é diferente. Ele nunca cumpriu tais condições. Tem estado na cozinha há dezenas de anos. E sequer conseguimos dizer em que outros lugares ele poderia ter estado antes. O que guarda nosso cofre? Esta é a nossa questão. Ela tem gerado muitos comentários maliciosos na vila. Mas para surpresa daqueles que imaginam que o Conselho não quer revelar o que tem guardado no cofre, eu posso afirmar que o que há no cofre não é do conhecimento de ninguém, nem mesmo dos integrantes do Conselho. Simplesmente porque o segredo do cofre não serve mais para abri-lo. Reconhecemos que esta situação não é de agora. Porque tentamos abri-lo por diversas vezes sem nunca ter obtido sucesso. Para desfazer a mística criada em torno dele: de que o Conselho guarda secretamente no cofre algo que não quer ou não pode compartilhar, vou revelar-lhes o segredo do cofre, pelo menos aquele que acreditamos ser seu segredo. E desafio qualquer um que quiser tentar abri-lo aqui e agora. O segredo é o seguinte: girar algumas voltas para a direita, livrando a roda do segredo até senti-la solta. Parar no 25, girar para a esquerda, dando uma volta completa, passando pelo 25 e parando no 34. Girar devagar para a direita e parar no 18. Abrir a chave e soltar a alavanca.

Camilo terminou provocativo:

- Então, alguém se oferece para tentar abri-lo? - esperou ainda alguns instantes em silêncio. Na sala não se ouvia nem um pequenino zumbido. Finalmente iniciou o debate.

- Vou passar a palavra agora aos que desejam se pronunciar a respeito do assunto em pauta.

Laurindo foi o primeiro a se manifestar:

- Não há nada de importante no cofre. Com certeza apenas um punhado de moedas velhas, se tanto, que não valem mais um tostão.

Tratava-se de um antigo narrador, que conhecia bem como funcionavam aqueles encontros. Podia-se notar que se colocava como representante dos que eram contra a abertura do cofre.

Imediatamente após sua fala, a sala foi bombardeada por conversinhas ao pé do ouvido: - O que ele disse não esclarece nada, tem coisa aí que ele não quer dizer. - Está na cara que desconversa. - Isso é típico dele, dizer que o assunto é irrelevante. - Ele tem razão, a gente perde muito tempo com essa bobagem.

Um comentário:

Anônimo disse...

Muito bem construído o blog. Com textos muito interessantes. Aguardo sua visita ao manifestopsicanalítico.wordpress.com
Um forte abraço, Melanie Salgado