Na
última prisão de Marco, a polícia lhe pediu uma quantia
considerável para não efetivar a detenção.
Ele
fora localizado em função de uma denúncia anônima. E já se
encontrava nas dependências da polícia quando sua mãe foi avisada.
Procedimento de rotina da autuação.
Carla,
sua mãe, soube da exigência que os policiais fizeram ao filho.
Então, denunciou o ocorrido ao Ministério Público. Ela não
aceitou pactuar.
Com
o filho aprisionado, ela pensou, sem o envolvimento diário com o
tráfico, talvez fosse uma oportunidade para ele refletir sobre seus
atos. Ao menos, ela aproveitava tais ocasiões para restabelecer seu
contato com ele.
O
que Carla fez não acontece todos os dias. Dificilmente uma família
aceita formalizar denúncias desse tipo, dando
margem
a
que
a corporação policial seja posta
sob
investigação. Nem tanto pelo descrédito na apuração de fatos que
poderiam revelar a corrupção policial e, sim, porque sempre
persiste o temor de retaliações.
O
policial não tem qualquer
noção
do lugar ético que ele ocupa na cultura. Por isto transita sem
problemas da conduta de controle sobre o lícito à prática do ato
ilícito. Essa indiferenciação deixa à flor da pele o jogo
perverso da ordem social.
Quando
Carla sustenta a denúncia, ela apela ao poder o esclarecimento
desses diferentes lugares.
Era
comum saber de histórias assim: o
policial prende o rapaz roubando, armado de revólver. O que faz em
seguida o policial? Ele negocia com o ladrão, o não registro da
ocorrência em troca da arma e do tênis de marca. Infelizmente é um
fato corriqueiro, se repete todo dia, da prática policial. O roubo
praticado pelo infrator é ilegal. Mas, como qualificar o ato do
policial que não registra a ocorrência em troca da arma, do tênis
ou do dinheiro? O
jovem
infrator odeia ainda mais: o policial e a sociedade. Porque
generaliza
a lição
que aprendeu
com o policial. O que ele aprende com essa experiência? Que a
polícia é corrupta. Que ele não pode confiar na corporação e,
por consequência, na sociedade também.
O policial fornece
ao rapaz uma única alternativa:
alimenta o descrédito na corporação policial e na autoridade
social que ela deveria representar. Daí
porque a
revolta e o ressentimento que transparecem no comportamento do
infrator não podem ser tomados como medida de sua barbárie.
Inserida
na rotina grosseira das reclamações, das apreensões e da
burocracia dos procedimentos judiciais, a polícia também desenvolve
uma visão pessimista e generalizadora do sistema, na qual se revela
o descrédito do
policial na
eficácia da justiça.
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