Quando a comitiva real portuguesa chegou ao Rio de Janeiro, em 1808, encontrou uma cidade cujo espaço público era conturbado, sujo, hostil e com um constante fluxo de pessoas. Deparou-se com uma população empobrecida que contava com enorme quantidade de escravos africanos. O governo real logo assumiu o desafio de manter sob controle essa população, com um aparato repressor cuja máquina já havia sido criada em Lisboa: a Intendência Geral da Polícia. O corpo policial militarizado dessa Intendência – a Guarda Real da Polícia – com ampla autoridade para manter a ordem, serviu de modelo às demais instituições policiais da cidade. A intendência se baseava no modelo francês introduzido em Portugal em 1760. Era o protótipo para uma ação policial autoritária. O intendente ocupava cargo de desembargador e era considerado ministro de estado. Seu poder era enorme: decidia sobre os comportamentos criminosos, estabelecia a punição que julgasse apropriada, prendia, levava a julgamento, condenava e supervisionava a sentença dos encarcerados. Ele representava a autoridade do rei, cujo cargo englobava poderes absolutistas: legislativos, executivos e judiciais. O mesmo decreto real que criou a intendência delegou também poderes de autoridade judicial sobre delitos menores à polícia. O gabinete do intendente e a Guarda Real eram pagos com o dinheiro arrecadado dos impostos sobre serviços e eventos públicos. A autoridade emanava do rei, mas os recursos para a polícia provinham de taxas, empréstimos privados e subvenções dos comerciantes locais e proprietários de terras. Essa situação refletia as ambigüidades políticas daqueles tempos. A missão da Guarda Real era manter a tranqüilidade pública entre outras obrigações relativas à ordem civil. A guarda se espraiava por diversos locais, principalmente na área do centro da cidade. Seus membros se vestiam como soldados, com jaquetas azuis e cartucheiras de couro a tiracolo. Lembrava a guarda republicana francesa. Para ajudar o trabalho de controle que cabia ao intendente, a cidade foi dividida em dois distritos judiciais, com dois juízes do crime, um para cada distrito. Esses juízes se subordinavam ao intendente e desempenhavam em seus respectivos distritos a mesma combinação das funções judicial e policial. O que nos leva a entender que a mistura dessas funções - judicial e policial - data da fundação da polícia no Brasil.
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