segunda-feira, 10 de novembro de 2008

Os destinos da polícia

A polícia se desenvolveu ao largo de um controle eficaz por parte do estado. Na maioria das vezes a corporação teve (e tem ainda) que se virar com suas próprias e peculiares soluções.
Isto se dá em razão do histórico abandono do estado, aferrado que se encontra a seu descompromisso com a política de segurança pública.
Hostilizada pela população pobre e desprezada pela elite, a polícia nunca desfrutou de um reconhecimento que a tornasse atraente enquanto status social.
A carreira policial brilha mais na fantasia infantil do que na ambição cultuada pelo indivíduo adulto. A permanência nos melhores cargos do sistema policial sempre apresentou característica transitória, servindo antes como trampolim para lançar o indivíduo numa situação mais confortável e elegante no sistema jurídico ou na administração pública.
A elite nunca teve interesse em se voltar para os problemas da ordem social, muito menos em se preocupar com os destinos da polícia.
Assuntos desagradáveis que colocam em pauta adversidades cotidianas são evitados em prol do bem-estar e do prazer mais nobre, não merecem ser evocados nas finas rodas. Esquecidos, permanecem confinados nos porões da exclusão.
Se nos anos noventa o campo policial tornou-se objeto de interesse crescente das precisas lupas da comunidade acadêmica, ou assumiu lugar de destaque nos debates intelectualizados sobre a cidadania em contraponto com a barbárie que assola o espaço urbano é porque a violência, antes restrita a áreas delimitadas da cidade marginalizada, derrubou os muros da segregação e ganhou as ruas da cidade européia que ainda existe no Rio, hoje muito menos demarcada do que antes, inviabilizando a distância asséptica até então garantida.
Pela natureza da tarefa que lhe cabe desempenhar, a polícia permanece em contato constante, às vezes por demais estreito, com os mais temíveis ou desavergonhados transgressores da ordem.
E a polícia consolidou a convicção de estar conduzindo uma luta sem apoio, mesmo por parte daqueles que supostamente estaria a serviço.
Responsáveis por manter a ordem pública, os policiais recebem a insígnia da autoridade, o que lhes confere certo grau de poder e de trânsito na cidade, mas não são bem instruídos tecnicamente e muito menos estão preparados do ponto de vista ético para entender criticamente o papel que lhes cabe desempenhar no cotidiano das ruas.
Apenas quando um policial se deixa apanhar, punições severas como a expulsão podem ocorrer, e os registros policiais estão cheios de ex-policiais, mas dificilmente se vê chegar ao Tribunal acusações contra policiais.
O que nos prova que a brutalidade no exercício de policiamento e a rede de corrupção que se articula nos bastidores da polícia são veladamente consentidas, desde que permaneçam subterrâneas no submundo, longe da visibilidade da vida civil.
Não se pode esquecer que a deterioração das relações sociais resulta da dívida social acumulada na história de descaso da elite que prefere manter seus privilégios, exibir suas jóias e seus carros importados, numa sociedade altamente estratificada, caminhando em direção a uma economia capitalista ainda mais selvagem, travestida de neoliberal, que eleva ao limite máximo a desigualdade social.

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